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SUMÁRIO / Matéria de capa

Jennifer Batten - Just Riff It !

05/08/2024 - 14:37h
Atualizado em 19/08/2024 - 18:00h



Reportagem: Alexandre Algranti | Fotos: Divulgação / Dorothy, Norway e Sam Emerson

 

Jennifer Batten viajou o mundo tocando lead guitar três vezes com o Rei do Pop nas turnês “Bad” (1987–1989), “Dangerous” (1992) e “HIStory (1996–1997)” e se apresentou para um bilhão de telespectadores no show do intervalo da final do Superbowl em 1993. Na sequência foi tocar com Jeff Beck (1999-2001) e desde então amealhou uma discografia considerável tanto como side woman como artista solo. De passagem pelo Brasil na turnê tributo a Michael Jackson do “impersonator” Rodrigo Teaser, ela concedeu uma entrevista antes do show em São Paulo e durante um workshop na escola de música Instituto IMKS.

 

 

 

Alexandre Algranti -  Como você conseguiu o melhor emprego do mundo como guitarrista durante uma década?

Jenniffer Batten -  Eu tinha 19 anos de idade e dava aulas no Musician´s Institute em Los Angeles. A escola tinha um serviço de indicações e um dia alguém da produção do Michael Jackson ligou e pediu que lhe fosse indicado dois guitarristas, isto na época bem antes dos telefones celulares. Um dia eu chego em casa e tinham três mensagens na secretária eletrônica: na primeira, alguém da escola falava sobre uma grande oportunidade; na segunda, a mesma voz, desta vez afoita, me pedia para retornar a ligação urgente e, finalmente, na terceira, a mesma dizia que era para tocar com o Michael Jackson e que era para eu retornar imediatamente. Eu liguei de volta e perguntei qual era a última data em que eu poderia me apresentar pois eu gostaria de me preparar ao máximo. Era 1987 e eu comprei o meu primeiro tocador de CD e eu fui tão preparada que quando eu cheguei lá não havia uma banda, era só eu e uma pessoa com uma câmera. Quando me pediram para tocar comecei a improvisar e depois toquei um cover de “Giant Steps” do John Coltrane com a técnica de  “two hand tapping”. Eu já tocava “Beat It” em uma banda cover desde 1984  e então mandei ver. Não contei para ninguém por causa do olho gordo…

 

Todo o dia eu voltava para casa e sempre tinham recados de outras pessoas, mas três ou quatro dias depois recebi um recado dizendo que o Michael estava interessado e que era para ir tocar com a banda para ver no que ia dar. Toquei por dois meses. No primeiro mês eram os músicos em uma sala, os dançarinos em outra e os cantores em uma terceira. No segundo mês foram todos junto com o Michael, um sistema de efeitos especiais e um sistema gigante de som. E ainda não me diziam se eu estava empregada.

 

A Sherryl Crow também estava na turnê e ambas estávamos muito inseguras pois ninguém falava nada se estávamos empregadas ou não. Aí eu tirei o meu passaporte e recebi uma passagem para Tóquio e aí caiu a ficha que as coisas estavam melhorando. Aí o Michael mandou fechar a Disneylândia de Tóquio para que pudéssemos curtir o local sem o público. Entrei numa loja para comprar uma escova de dentes com o formato da Margarida e ao manuseá-la o Michael bateu no meu ombro e me falou que gostou muito do meu solo na “Beat It”. Aí pensei: “estabilidade de emprego”! (risos).  Mas eu nunca tomei como certo que eu faria turnê após turnê por dez anos.

 

 

AA - E como foi tocar com o Jeff Beck ?

JB - Eu nunca imaginei que dividiria o mesmo palco como um artista como ele. Quando fiz a turnê do disco “Dangerous” do Michael Jackson, o técnico de teclado era o mesmo do Jan Hammer, o tecladista do Beck, e ele me perguntou se eu gostaria de conhecê-lo e que me apresentaria a ele. Então, quando tocamos na Inglaterra, conseguimos um contato para que ele viesse assistir a um dos shows. No dia seguinte fui visitá-lo num estúdio e ele começou a tocar seu clássico “Blue Wind” e eu curti muito. Depois ele me levou de volta ao hotel em um carro que parecia o Batmóvel, andava muito rápido, e aí pensei, se eu for morrer em um acidente de carro, vai ser com o Jeff Beck, vai ser muito rock and roll! (risos)

 

Um mês depois ele me ligou e disse que havia ouvido o meu disco solo e depois me convidou a gravar junto com ele. Ele me elogiou tanto que eu daria tudo para ter gravado aquela conversa, mas foi só cinco anos depois que eu realmente toquei com ele. Mas sempre que eu o encontrava ele me dizia que iríamos tocar juntos.

 

Em 1999 ele finalmente me liga e me diz “nós temos uma tour, então vamos”. E eu pensei, nunca tocamos juntos e como ele tem toda essa confiança em mim? Naquela época eu já tinha dois discos lançados e já sabia tocar o disco “Guitar Shop” dele, então fui ensaiar com ele e a meia noite a mulher dele nos serviu whisky, mas eu tinha um vôo para a Itália na manhã seguinte e pensei que não iria ser bom. Mas no final acabamos gravando dois discos e foi incrível viver em um ônibus com ele, escutando música com ele, foi incrível.

 

 

 

 

AA - Como foi viajar o mundo com o maior artista de seu tempo?

JB - Foi uma espécie de Disneylândia para músicos. Eu já era fã do Michael e conhecia toda a sua música, eu seguia ele desde a turnê “Off The Wall”. E o fato dele ser o maior do mundo foi muito divertido.

 

 

AA - O que te espantava ? O que te desafiava?

JB - Não havia desafios pois éramos muito mimados, eram grandes hotéis, caterings excelentes, tocamos duas a três vezes por semana então tínhamos muito tempo para visitar as cidades pelas quais passávamos. Isto é pouco usual nas tours já que tudo é tão caro na estrada. Talvez o único desafio era a saudade de casa, pois foi muito antes da internet. Eu lembro que ao ligar para os meus pais uma chamada de 10 minutos custava 60 dólares. Eu não me comunicava muito com meus amigos e a minha família e hoje qualquer um pode te mandar uma mensagem de texto a qualquer momento.

 

 

AA - E o Michael era muito exigente na estrada?

JB - Sim e não. Ele esperava muito que você tocasse os sons dos discos, ser pontual, obviamente, e tocar num nível muito alto. Mas em termos da sua personalidade, ele nunca foi maldoso com ninguém. Na turnê “Bad” ensaiamos durante um mês direto antes mesmo de conhecer ele, então já sabíamos as músicas de cor, e quaisquer comentários vinham através do diretor musical após ele assistir os vídeos dos ensaios, que na época era o Greg Phillinganes. O máximo que o Michael se intrometeu foi alterar os tons das músicas. Ele cantava notas altas nos estúdios mas não estava dançando nas gravações, então ao vivo baixamos os tons de músicas como “Beat It”, que originalmente estava em E mas baixamos dois tons, eu usava uma guitarra especial para tocar esta música ao vivo.

 

 

AA - E qual turnê você curtiu mais?

JB - A turnê “Bad” de 1987, era tudo novo, ele estava muito feliz e tinha uma energia animal. Os ensaios matavam todos de cansaço menos ele.

 

 

AA - Eu lembro o dia da morte dele, estava nos EUA no carro, não estava sabendo, liguei o rádio e só tocava ele em todas as emissoras, aí a ficha caiu ao passar pela quinta emissora…

JB - Ele foi muito jovem, tinha muito a oferecer ainda…

 

 

AA - E os shows com o Jeff Beck no Brasil?

JB - Me lembro muito do show no Rio, o Wayne Shorter estava no festival também. Fizemos dois shows num mesmo dia e foi muito puxado, jamais quero fazer isto outra vez.

 

 

AA - Qual sua tecnologia musical favorita?

JB - Creio que é o pedal Whammy da Digitech, eu uso ele para simular um slide de guitarra onde eu ajusto para fazer um bend down de um passo completo, tenho usado muito desde a sua invenção.  

 

 

AA - Qual é a tecnologia musical mais importante ao seu ver, aquela que realmente facilitou a sua vida?

JB - Há pouco tempo comecei a usar modeladores de amplificadores de guitarra. É impressionante, você pode acessar o modelo de qualquer amplificador que já foi fabricado. Você não precisa gastar  50 mil dólares para comprar todos aqueles amplificadores e nem sofrer de hérnia para carregar eles por aí, pois agora estão em um chip e são extremamente bons. Precisa investir um tempo para aprender a usar, escutar e fazer os ajustes, mas nunca estive tão feliz. Eu uso o Line 6 CX e recentemente comprei um Quad Cortex.

Tive tantas situações com as companhias aéreas que hoje tudo o que eu preciso eu levo na bagagem de mão.

 

 

AA - “A American quebrou minha guitarra…”(risos)

JB - Eu já foi endorser de várias marcas mas hoje como uma free agent eu curto muito explorar novos produtos. Acabei de ganhar uma guitarra da marca brasileira Music Maker que curti muito. Ela soa diferente das guitarras que eu trouxe dos EUA então comecei a programar o modelador para ela. Ela é linda, muito bem feita e soa excelente.

 

 

AA - Quando você decidiu se tornar uma profissional de música?

JB - Aos doze anos falei para minha mãe que gostaria de tocar guitarra e ela me respondeu que era uma carreira muito competitiva. Ela me amedrontou com isso (risos) e isto não havia me ocorrido.

 

 

 

 

AA - E qual o primeiro instrumento que você tocou ?

JB - Foram aquelas flautas doces de plástico que tinha na escola. Aos oito anos de idade ganhei uma guitarra da qual me esqueci a marca, era elétrica com as cores preta, azul e vermelha, era linda.

 

 

AA - E quantas centenas de guitarras você tem hoje?(risos)

JB - Eu não coleciono muitas, tenho umas dez em casa, mas a minha casa é pequeno e quando elas começam a acumular eu começo a vendê-las.       

 

 

AA - Me falaram que você curte a cultura “steampunk” que mescla a tecnologia da Era Vitoriana com a era da informação. Você consegue imaginar instrumentos steampunk, tipo um sequencer mecânico? Uma bateria a vapor? (gargalhadas). Qual seria o seu instrumento steampunk favorito?

JB - É melhor maneirar com o que você coloca num instrumento, quanto mais metal mais pesado ele fica. Mas tem um cara na Nova Zelândia imprimindo guitarras em 3D e uma delas tem engrenagens móveis. Eu queria tocar ela mas nunca consegui…

 

 

AA - A pianola talvez foi o primeiro instrumento steampunk da história. E que criou o conceito de cópia mecânica da indústria fonográfica…

JB - Eu toco numa banda chamada “Jennifer Batten at Full Steam” e todos vestimos roupas com a estética steampunk e colocamos engrenagens grandes no palco e tal. Eu também crio esculturas com a temática steampunk. Muita fantasia, dirigíveis, todo tipo de coisa louca.

 

 

AA - O último disco do Rush teve uma temática steampunk bem legal.

JB - Sim, mas tem outras bandas que fizeram isso também.

 

 

AA - É um conceito muito interessante, pois foi na Era Vitoriana que a tecnologia realmente começou a progredir. A relação entre a matemática e a mecânica, os computadores mecânicos do Charles Babbage calculando tabelas de logaritmos e programados pela Lady Ada  Lovelace, tudo muito louco.  Pena que ele não tinha tecnologia suficiente para progredir…

JB - Ele precisava de mais mulheres trabalhando com ele! (Risos).

 

 

AA - Com certeza, as mulheres são grandes programadoras de computadores. Mas como você protegeu a sua audição depois de tantos anos na estrada?

JB - Não muito bem e atualmente tenho problemas. Três anos com o Jeff Beck deixaram suas marcas. Tentei usar plugs de ouvido mas ao tocar como um cara como o Jeff uma hora o volume está no dez e em outra está num sussurro. Então os plugs não funcionaram para mim.  Mais ou menos há dez anos eu descobri os produtos da Sensaphonics que fazem monitores in ear com microfones nas suas extremidades então você pode dosar o som ambiente no bodypack. Tenho usado desde então onde fico exposta a cerca de 25% a 30% da intensidade do som do palco. Quando saíram custavam 2500 dólares, mas agora tem uma empresa chamada ASI que vende um produto similar com a tecnologia “3D ambient” na Amazon por oitocentos. A maioria dos shows que eu faço requerem monitores in ear e com este dispositivo eu resolvo a questão da sensação de isolamento de quem usa in ears.

 

 

AA - Se você pudesse montar uma banda com qual músico vivo ou não, com quem o faria?

JB - Jaco Pastorius no baixo, Joe Zawinull nos teclados, Peter Erskine na bateria e Peter Gabriel.

 

 

AA - E como se chamaria ?

JB - “My Heroes”. (Risos).

 

 

AA - Quem está tocando na sua playlist?

JB - Taylor Swift, Mateo Mancuso e Giacomo Turra. E tem um cara que conheci recentemente, o Jeff Gardner.

 

 

AA - Quais cinco discos você levaria numa viagem a Marte?

JB - O “Mr.Gone” do Weather Report, “Wired” do Jeff Beck, “Deep Forrest” da banda com o mesmo nome, “So” do Peter Gabriel e “Sensual World” da Kate Bush. Tem de tudo !

 

 

AA - Tem algum músico brasileiro com quem você gostaria de tocar?

JB - Os músicos no Brasil são tão bons que me assusta pensar em tocar com eles. Um deles é o Leandro Gomes da banda do Rodrigo Teaser com quem estou fazendo a tour de tributo. E tem a Lari Basilio que tocava na mesma banda. Hoje ela está em Los Angeles tocando com os melhores artistas de lá.

 

 

AA - Qual conselho você daria a uma jovem menina que gostaria de tocar guitarra profissionalmente, em um mundo dominado por homens, por assim dizer?

JB - Eu diria que a hora é agora, nunca houve um tempo tão amigável para que uma mulher se tornasse uma artista profissional. E se você encontrar oposição ou negatividade, siga em frente. Você não precisa impressionar ninguém, siga em frente e encontre um grupo de pessoas que te aceite e continue a tocar.

 


 

Discografia recomendada

Jennifer Batten's Tribal Rage: Momentum

Guitar Zeus (com Carmine Appice)

Who Else! (com Jeff Beck)

You Had It Coming (com Jeff Beck)

Live at Wembley July 16, 1988 (com Michael Jackson)

 


 

Agradecimentos: Kleber K Shima e o time do Instituto IMKS, Rodrigo Teaser e Priscila Teaser

 


 

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