O meio musical foi agitado, no inicio de maio, pela live da cantora Anitta com o deputado Felipe Carreras (PSB/PE). Durante a transmissão, Anitta questionou o deputado sobre o texto de emenda dele incluída na MP 948, na qual é proibida a cobrança de direitos autorais de pessoas físicas ou jurídicas em eventos públicos ou privados que não sejam o intérprete. A cantora foi incisiva ao falar sobre a falta de diálogo com os compositores e sobre o que significa a perda deste rendimento para os compositores. A transmissão do debate aconteceu em 5 de maio. No dia 6, o deputado retirou a emenda.
Por conta da discussão, a Revista Backstage procurou o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (ECAD) e mandou perguntas a respeito da situação dos direitos autorais e conexos em tempos de pandemia e plataformas digitais. Além das respostas, publicamos também a nota do ECAD a respeito da emenda do deputado Felipe Carreras à MP948.
Como surgiu e o que é o ECAD?
O Ecad é o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição. É uma instituição privada, sem fins lucrativos, com 43 anos de existência e administrada por sete associações de música: Abramus, Amar, Assim, Sbacem, Sicam, Socinpro e UBC. O Ecad é o elo que conecta compositores, intérpretes, músicos, editores e produtores fonográficos aos canais e espaços onde a música toca e emociona as pessoas.
A criação do Ecad foi uma demanda da própria classe artística para ter, no Brasil, uma entidade responsável por centralizar a arrecadação e a distribuição dos direitos autorais de execução pública musical.
Toda a atuação do Ecad é pautada pelas leis 9.610/98 e 12.853/13, que regem o direito autoral no Brasil. Além do permanente acompanhamento de atividades por parte das associações de música que nos administram, nosso trabalho é supervisionado pela Secretaria Especial da Cultura do Ministério do Turismo.
Como está se comportando a arrecadação durante este tempo da pandemia? Quando começaram a perceber que a pandemia teria reflexos na arrecadação?
As associações de música e o Ecad expressam sua profunda preocupação com o momento atual vivido pelas indústrias da cultura e da música brasileiras em decorrência da pandemia do coronavírus. Embora o isolamento social seja a principal e necessária arma contra a disseminação da Covid-19, existe um expressivo prejuízo econômico que já pode ser sentido em estabelecimentos do setor, como teatros, cinemas, bares, restaurantes, lojas e demais comércios.
A interrupção das atividades ou a diminuição de público desses locais, somada ao adiamento e cancelamento de shows, eventos e festivais, certamente trará prejuízos irreparáveis à classe artística. Entre os meses de março e maio de 2019, a estimava era uma média de 6,6 mil shows e eventos por mês, realizados em todo o Brasil, que equivaleria à arrecadação média de R$ 11,3 milhões de reais mensais em direitos autorais. É possível, a partir destes números, dimensionar ou, ao menos, vislumbrar o volume da perda para milhares de titulares que vivem desta receita.
O Ecad está participando de ações que podem compensar uma queda de arrecadação para os compositores? Ou isto está mais por conta das sociedades arrecadadoras separadamente?
A gestão coletiva da música no Brasil - composta pelas associações Abramus, Amar, Assim, Sbacem, Sicam, Socinpro, UBC e pelo Ecad, administrado por todas elas - traçou um plano emergencial para ajudar compositores e artistas de todo o país, duramente atingidos pela crise por conta dos cancelamentos de shows, eventos e do fechamento de estabelecimentos comerciais sonorizados. Está em andamento o plano de adiantamento extraordinário destinado a 21 mil compositores, intérpretes e músicos brasileiros, titulares de obras musicais que tiveram rendimento médio anual entre R$ 500 e R$ 36 mil nos últimos três anos. O montante total será de R$ 14 milhões, divididos entre abril (já pago), maio e junho. Este adiantamento extraordinário será devidamente discriminado no demonstrativo de rendimentos recebido por cada titular. Os valores adiantados serão descontados posteriormente, 60 dias depois de anunciado o final do estado de calamidade pública e em até 12 parcelas mensais iguais e sem juros.
Há outras matérias relativas ao direito autoral correndo no Congresso? Como é possível ao músico/compositor acompanhar estas matérias?
As associações de música e o Ecad acompanham de perto quaisquer tentativas de supressão dos direitos autorais dos compositores e demais artistas. Todos os autores, músicos e intérpretes podem procurar suas associações de música para obter mais informações sobre projetos de lei e outras medidas relativas ao direito autoral.
Qual o papel do ECAD na arrecadação dos direitos conexos?
O Ecad recolhe direitos conexos em todos os segmentos exceto no streaming, segmento em que o mercado se configurou de forma diferente. O Ecad já se manifestou diversas vezes a favor desta cobrança e que esse é um debate que não se resume ao Brasil. Os titulares devem buscar suas associações para tratar desse assunto.
Na pandemia, lives e streamings ganham importância na arrecadação. Como o Ecad está se posicionando com relação a isso? Os percentuais são satisfatórios para os compositores? Tem ações visando aumentar essa arrecadação?
O Ecad esclarece que já tem contratos com plataformas como YouTube e Facebook/Instagram, o que significa que as músicas nelas executadas têm seus direitos autorais protegidos.
O Ecad está preparado para realizar a distribuição relativa às lives desde que as plataformas relacionem todas as obras tocadas nos relatórios de uso que elas nos enviam regularmente. Toda a distribuição de direitos autorais neste segmento é baseada nas informações que constam nesses relatórios das músicas tocadas.
A gestão coletiva da música no Brasil (associações de música e Ecad) está permanentemente atenta ao mercado e às novas formas de consumo de música para continuar assegurando à classe artística o respeito a seus direitos.
Nota com o posicionamento do Ecad sobre a MP 948
A proteção do direito autoral é garantida, no Brasil, pela Constituição Federal em seu artigo 5º., parágrafos 27 e 28, bem como pelo Código Civil Brasileiro e pela Lei 9.610/98. Portanto, o Ecad entende que a Medida Provisória 948, que trata da relação de consumo decorrente do cancelamento de serviços e reservas de shows e eventos por conta do coronavírus, não é o instrumento apropriado para um debate sobre o direito autoral em execução pública de música.
A indústria da música e o setor de shows e eventos foram duramente atingidos pela pandemia. Portanto, alterar a lei de direitos autorais por meio de uma MP no contexto de uma crise sanitária sem precedentes, que tem provocado sofrimento e mortes a milhares de brasileiros, é de um oportunismo sem limites.
O deputado Felipe Carreras, autor da emenda à MP 948, propõe a proibição da cobrança de direitos autorais de pessoas físicas ou jurídicas em eventos públicos ou privados que não sejam o intérprete e afirma que a medida não tira nenhum direito dos compositores e demais titulares. Isso não é verdade.
Compositores não recebem cachê. Muitos nem fazem shows ou ganham com imagem. Os direitos autorais garantem, portanto, a devida remuneração aos envolvidos pelo alcance da sua obra, em uma execução pública. Por isso, no mundo inteiro, quem paga o direito autoral é o produtor e não o intérprete, de acordo com o tamanho de público do seu evento.
A emenda não só reduz a remuneração dos compositores, como tira a responsabilidade dos produtores dos eventos em pagar pelo direito autoral e a transfere para os intérpretes.
O Ecad é uma empresa privada, sem fins lucrativos, e administrada por sete associações de música. A empresa é auditada anualmente por empresas independentes e por órgãos públicos como a Receita Federal e o INSS. Os balanços patrimonial e social estão disponíveis no site oficial, assim como todas as regras de cobrança e distribuição e nossa tabela de preços. Além disso, o Ecad é supervisionado pela Secretaria Especial da Cultura do Ministério da Cidadania.