Ouvir música muitas vezes nos leva a lugares e tempos diferentes. Mas, para que isso aconteça, é necessário que seja possível escutar essas músicas. Seja restaurando áudio, digitalizando acervos em imagem ou vendendo discos, Sérgio Nascimento mostra que a viagem no tempo é possível.
O fascínio pelo áudio
A atividade com áudio começou para Sérgio ainda em 1988. “Na época, consegui um estágio na Polygram e trabalhei como assistente de estúdio. Participei da gravação de vários discos e conheci artistas como Beth Carvalho, com quem desenvolvi uma amizade”, comenta o engenheiro de som. Na época, a gravadora passava por mudanças, inclusive o fechamento de estúdios, o que levou Sérgio a buscar outras oportunidades.
Antes de se estabelecer definitivamente como profissional de áudio, ele estudou Engenharia Eletrônica na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Na mesma instituição, fez um Mestrado em Acústica na COPPE - Engenharia Mecânica, no qual escreveu a dissertação "Determinação Numérica dos Modos de Baixa Frequência em Salas Cilíndricas e Prismáticas", orientado pelo professor doutor Jules Ghislain Slama e coorientado por Weber Mansur, da Engenharia Civil, o que lhe deu uma boa base teórica para os desafios que encarou durante a carreira.
A virada profissional
Em 1997, aconteceu a virada profissional definitiva, quando começou a trabalhar nos Estúdios Visom, onde se especializou em restauração e masterização e gerenciou a gravadora de música instrumental. A história na recuperação de áudios começou a ganhar mais importância em sua carreira no ano de 2001, quando Sérgio se destacou no projeto de recuperação do acervo da reserva musical do Instituto Moreira Salles. “Trabalhei na recuperação do acervo de Humberto Franceschi, que me escolheu para fazer as músicas de seu livro ‘A Casa Edison e seu Tempo’, considerado um dos melhores trabalhos de restauração de discos 78 rpm do Brasil. O projeto todo teve mais de 13 mil músicas, divididas por uma equipe de 12 profissionais”, aponta Sérgio.
A atuação no projeto levou o profissional de áudio a encarar um novo desafio: trabalhar na restauração do acervo da Rádio Nacional. “O convite para trabalhar na Rádio Nacional veio através da Visom, que ganhou o edital para a recuperação do acervo”, relembra. O trabalho da Rádio Nacional, realizado no Museu da Imagem e do Som do Rio (MIS-RJ), começou em 2005 e envolveu a recuperação de acetatos: discos graváveis que registravam gravações de áudio em uma película fina sobre uma base metálica ou em vidro, estes últimos usados na época da 2ª Grande Guerra. "Os acetatos da Rádio Nacional eram grandes, com 16 polegadas, e ofereciam uma qualidade impressionante", comenta Sérgio Nascimento. Para ele, uma das descobertas mais marcantes foi o quanto os acetatos preservavam aspectos históricos únicos.
O trabalho de restauração enfrentou desafios técnicos, como a recuperação de discos que estavam severamente danificados: trincados, soltando pedaços, quebrados, arranhados, revelando material nunca mais tocado desde sua gravação e inédito há décadas, desconhecido até para os maiores estudiosos da Rádio Nacional. Através do desenvolvimento de uma técnica artesanal própria de edição de áudios de até menos de 100 ms, conseguiu recriar histórias montando um quebra-cabeças de pequenos sons. Um programa de 20 minutos recuperado poderia conter até 400 pontos de edição.
Outro grande projeto do qual participou aconteceu em 2022, no Bicentenário da Independência do Brasil. Foi o livro D. Pedro I: compositor inesperado, organizado pelo musicólogo Ricardo Cravo Albin, que teve incluído um CD reunindo gravações antigas e novas de sinfonietas, hinos e músicas sacras inéditas compostas pelo primeiro imperador do Brasil (é possível ler a matéria na Revista Backstage aqui). Sérgio Lima Nascimento foi o responsável pela restauração das faixas vindas de LPs e 78 rpm e pela masterização do trabalho completo, incluindo as gravações inéditas com orquestra. Também é possível ver o nome do engenheiro de masterização nos créditos do LP Canções Brasileiras, de Novelli, relançado em 2024 pela gravadora Rocinante, entre diversos outros trabalhos.
A loja
Em paralelo ao trabalho diretamente com áudio, desde os anos 2000 Sérgio começou a investir na construção de sua loja de cultura: a La Macchina del Tempo. O local foi inteiramente projetado por ele, incluindo uma parte acusticamente preparada para os serviços especializados de restauração de áudio. A loja é um ponto de encontro para colecionadores e apreciadores de música e arte que buscam não apenas adquirir novos itens para suas coleções, mas também entender mais sobre a história por trás dos sons. Seja músicas, filmes ou livros, lá são oferecidos tanto produtos novos como raridades.
Sérgio deixa claro que seu trabalho é, antes de tudo, uma paixão pela música e pela história que ela carrega. “Minha loja reflete minha paixão pela música e pela acústica, e o trabalho que realizo continua a buscar a melhor qualidade sonora”, destaca. O engenheiro de áudio leva sua paixão pela cultura também para o canal com o mesmo nome da loja no YouTube (La Macchina del Tempo). Lá é possível encontrar desde vídeos didáticos para profissionais de áudio que se interessem por restauração e masterização até vídeos que divulgam os seus trabalhos.