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REPORTAGENS / Matérias Completas

Full Sail University e Revista Backstage

15/03/2021 - 07:42h
Atualizado em 17/03/2021 - 15:15h

 

Carol Olival, da Full Sail University, conversa com Felipe Tichauer, vencedor de dez Grammys latinos, tendo trabalhado com personalidades como Céu, Elza Soares, Jennifer Lopez, Rod Stewart e muitos outros. Felipe Tichauer é engenheiro chefe e dono do Red Traxx Mastering- Miami, FL. Vencedor de 10 Grammy Latino ele já foi pessoalmente indicado por cinco vezes na categoria Best Engineered Album, vencendo em 2017 nesta categoria com o álbum Tropix da cantora Céu. Formado pela Full Sail em 98, já participou em mais de 80 projetos indicados para o Grammy e Latin Grammy Awards. Seus trabalhos incluem nomes como Ricky Martin, Sting, Christina Aguilera, Jennifer Lopez, Maria Bethania, Gal Costa, Brian McNight, Rod Stewart, Michael Bolton, Céu, Arnaldo Antunes, Carlinhos Brown, Farruko, J Balvin, Maluma, Luis Fonsi, Timbaland, Elza Soares, Natiruts, Ziggy Marley, Disney e muitos outros.

 

 

Carol: Uma alegria estar com você novamente, Felipe! Gostaria de pedir para você começar se apresentando, contando um pouquinho sobre você.

Felipe: Sou brasileiro e estou nos Estados Unidos faz 21 anos – vim pra cá com 17 anos, estudei na Full Sail University, me formei no programa de Recording Arts e vim pra Miami depois da formatura trabalhar com televisão e música e hoje sou engenheiro de masterização. Me formei com 18 anos e foi uma jornada muito legal. Eu lembro que a minha mãe, quando se despediu de mim, saiu de casa e fechou a porta, bateu aquele friozinho na barriga. Mas foi muito bom que meus pais me apoiaram tanto dessa maneira, me sinto privilegiado.

 

 

Carol: Felipe, eu sei que a gente não trabalha para receber prêmio mas, como é ter tantas indicações ao Grammy e ter recebido tantos prêmios?

Felipe: Falando de projetos que ganharam Grammy, participei de dez projetos vencedores. Tenho duas estatuetas e oito certificados. São nove indicações pessoais, que eu considero que valem muito porque são indicações minhas como profissional. Na categoria de melhor engenheiro de som foram cinco indicações, duas indicações de álbum do ano e duas de record of the year - que é a gravação do ano, a faixa do ano - que são prêmios que vão para os times todos envolvidos no projeto. No total são nove indicações pessoais, dez vitórias e 84 projetos indicados, incluindo o Grammy americano e o latino.

 

 

 

Carol: Qual a importância desses prêmios para você?

Felipe: Acho importante porque é o reconhecimento da indústria, dos seus colegas e que ajuda na credibilidade junto aos clientes, porque é uma validação do nosso trabalho. Hoje em dia eu não trabalho pensando em prêmios. Fico muito feliz quando sou indicado. Principalmente nas categorias de engenharia de som, por ser uma categoria técnica e focada totalmente no som em si. Minha busca diária é melhorar meu som e ser melhor hoje do que eu fui ontem. O Grammy mostra o esforço e o talento das pessoas que trabalharam nos projetos indicados e vencedores, mas não pode ser o propósito do trabalho.

 

 

Carol: Você concorda com as escolhas das premiações que você recebeu?

Felipe: Poxa, nunca vou falar que um trabalho meu deveria ter ganho um Grammy, seria muita arrogância. Fico muito feliz de ver o trabalho desses artistas, principalmente independentes, conseguindo se destacar. E não somente de projetos que eu trabalhei. Mesmo quando não se ganha o premio, acho importante sempre se motivar a melhorar para os próximos. E todas essas premiações são subjetivas, como toda arte é.

 

 

Carol: E a opinião de quem te importa? Do jurado, do seu contratante? Do músico?

Felipe: As críticas geralmente vêm do engenheiro de mixagem, do produtor, do artista e, às vezes, até mesmo do leigo. Quando alguma critica vem antes da música estar aprovada e tocando no rádio, a gente discute e respeita a opinião dos profissionais, porque no final a música é do artista. É uma relação de confiança e de trabalho em equipe. Eu preciso sempre fazer meu melhor e captar a visão do artista e entender que nem sempre o que eu acho que é melhor é o certo, até para chegar ao resultado que o artista está buscando.

 

 

 

Carol: Você consegue contar pra gente um pouco sobre os artistas com os quais você já trabalhou?

Felipe: Ah, eu tenho trabalhos com a Céu, Gal Costa, Maria Bethânia, Arnaldo Antunes, muita gente... É ruim fazer a lista porque acabo deixando alguém... A Elza Soares fez um trabalho que foi muito importante pra mim. Trabalho com muitos artistas latinos famosos também: Maluma, Rick Martin, Jennifer Lopes, Cristina Aguilera... E eu gosto muito dos trabalhos independentes, que chegam muito livres.

 

 

Carol: De todos os trabalhos que você fez teve algum que foi muito desafiador, que te trouxe mais provocações para você entregar sua peça final?

Felipe: No disco da Elza Soares, Mulher do fim do mundo, a Elza estava fazendo um disco autoral, coisa que ela nunca tinha feito – e ela se juntou com uma galera muito legal de São Paulo, muito antenada, e fez um disco muito arriscado. Um disco completamente diferente do que ela já tinha feito na vida inteira. Eu lembro que apareceu esse convite e eu topei. Fiz a máster que precisava ser entregue no dia seguinte. Fiquei até as 5 da manhã com o produtor Guilherme Kastrup, e ele queria uns efeitos que ele não tinha feito na mixagem e ele pediu que eu fizesse para costurar uma música na outra. Lembro que masterizando a Elza, tinha uma frase que ela falava: “deixa eu cantar até o fim, deixa eu cantar até o fim” e eu fiquei pensando: será que eu estou trabalhando na última música dela? Eu fiquei arrepiado. Esse disco ganhou um Grammy e foi muito importante, emblemático pra mim.

 

 

Carol: E quando termina um trabalho desses é uma sensação de alívio ou de apreensão?

Felipe: Eu acho que um projeto nunca termina porque ele é vivo. E tem as duas coisas, alívio e apreensão porque tem uma pressão enorme de agradar a todos. Eu nem penso muito, para não ter muita noção da pressão, vou no instinto sempre. Esse negócio de ter que entregar é difícil. Essa pressão é boa e ruim, porque as vezes a gente perde a objetividade. Eu vou na linha do “gostei, está me emocionando, está bom”. O lance da experiência – são 20 anos – a coisa do dirigir um carro, falar no telefone, trocar marcha comendo um BigMac e mudar de  faixa na rodovia, sabe? Se você é novo, você não consegue fazer tudo ao mesmo tempo. A experiência é importante para você conseguir realizar o som que você imagina sem ter que pensar muito e sem demorar. Essa é a diferença entre alguém que está começando agora e alguém que já tem anos de estrada. É o que acontece com o guitarrista que vai fazer um solo, ele não fica pensando na escala que ele vai tocar, ele só toca.

 

 

Carol: Quem são suas referências hoje, Felipe?

Felipe: Eu escuto tudo, as músicas que estão tocando, as dicas de colegas, busco não ficar bitolado em um estilo. Se as pessoas estão ouvindo eu preciso ficar ligado, porque isso me afina o ouvido antes de trabalhar. As vezes nem são sucessos recentes, mas tem a sonoridade que eu preciso ouvir antes de fazer um trabalho novo, para sentir o grave e o agudo e fixar na memoria como é ouvir aquele som perfeito. Nunca vai ser igual porque as gravações são diferentes e as mixagens são diferentes, mas é um ponto de partida.

 

Carol: Quantas horas por dia você trabalha?

Felipe: Um dia pesado eu começo às 10 da manhã e termino às 3 da manhã do dia seguinte. Não recomendo essa loucura, mas eu trabalho quase sempre 10 horas por dia. Quando eu era engenheiro de gravação era todo o dia 15, 16 horas por dia sem parar, sem feriado, Natal, nada.

 

 

 

 

Carol: Quais são as habilidades que um profissional de áudio precisa ter para masterizar com qualidade?

Felipe: Vou falar de 2 pontos: o técnico e o relacionamento com o cliente. No técnico, você precisa saber identificar o que é um som bom. Se você não souber identificar o que é qualidade, você não vai conseguir produzir qualidade. Precisa ouvir muitos discos e analisar o que traz a dimensão no som – aprender a ouvir. É importante adquirir experiência, fazer, desenvolver bom gosto sonoro e musical. Precisa ter uma sala equilibrada em termos acústicos. Já na área do relacionamento é importante conseguir ler o cliente. Qualquer área do som e da arte precisa disso. Hoje em uma pequena conversa com o cliente eu já sei o que eles querem, o que eles esperam. A masterização é uma coisa que vem com a experiência, não tem muito como pular etapas, para fazer em alto nível, todos os dias, em todos os projetos, é preciso criar repertório. Desde o artista independente até o talento mais reconhecido no mundo, todos esperam nada menos do que perfeição na masterização. Ter um sucesso é sorte. Fazer 40, 50 anos trabalhando, isso sim é talento.

 

 

Carol: Queria terminar te perguntando sobre sua carreira. O que te levou a optar por estar nos USA e não no Brasil?

Felipe: Na minha época não tinha escola como a Full Sail no Brasil, com acesso a equipamentos e conhecimento. Os Estados Unidos são uma referência para o mundo, e eu queria aprender com eles. Eu queria entender o líder e aprender com o líder, eu achava que se um dia eu voltasse ao Brasil isso me ajudaria. Isso pesou bastante para mim no início. O americano tem uma forma de fazer business que me interessa. Musicalmente o Brasil talvez até seja mais avançado do que os Estados Unidos, mas a cultura pop aqui é inegavelmente mais desenvolvida. Aqui é tudo dividido, a gente pode se especializar, não precisamos fazer um pouco de tudo. Eu não queria ser o profissional que faz tudo, eu achei meu nicho e escolhi focar nele. É como ser cirurgião especializado em uma área do cérebro. Eu sou especializado em masterização e é isso que eu quero fazer.

 

 

 

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