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REPORTAGENS / Colunas

Som nas Igrejas

06/09/2024 - 17:44h
Atualizado em 06/09/2024 - 17:46h


 

Quem procurar o termo 'patch' em inglês encontrará mais de uma dúzia de definições. Para os nossos fins, a que mais se aproxima seria a de 'uma conexão destinada ao uso por um tempo limitado'. Mas no nosso caso, não é tanto esse 'tempo limitado' que se aplica, e sim a possibilidade de reconfigurarmos essa conexão para outra aplicação. Este uso da palavra teve sua origem com as centrais telefônicas há uns 130 anos.

 


 


As telefonistas recebiam um pedido de ligação e conectavam fisicamente o cabo com o sinal da chamada recebida na linha que a conduziria ao destino desejado. Vale a pena reparar nos plugs, na imagem sobreposta no canto inferior direito. Sim, se você não sabia, naquela época já eram usados os ancestrais dos TRS (ou P10 estéreo). Devemos a invenção dos nossos sistemas balanceados aos primórdios da telefonia. Depois de muito apanharem com perdas e ruídos nas conexões, os engenheiros desenvolveram essa tecnologia. Levando em conta as distâncias entre telefones, essa ainda não era uma solução definitiva, mas ajudou a reduzir em muito a pobre qualidade que tinham antes de balancearem o sinal.

 

Passando para os estúdios de gravação, é comum vermos ali os chamados patchbays, que em sua face posterior recebem os cabos que vêm das entradas e saídas das consoles e dos equipamentos periféricos, como pré-amplificadores, módulos de efeitos, compressores e gravadores. Com eles, quando o operador deseja conectar um equipamento ao outro, não é preciso entrar atrás dos racks ou da console para fazer a conexão. Basta pegar um cabo e fazer o tal patch, conectando a saída de um equipamento à entrada desejada no outro. Isso poupa os conectores dos equipamentos de estúdio de serem desgastados e os técnicos de precisarem entrar em espaços difíceis para acessá-los.



 


 

 

Voltando ao universo de PA, nos grandes shows é comum que os sinais precisem ser enviados e recebidos entre múltiplas fontes e destinos. Poderíamos considerar aqui os splitters como talvez um dos tipos de patch mais elementares, em que um sinal é recebido do palco e o splitter faz cópias dele para, por exemplo, a mesa de PA, a de gravação e a de monitor. A rigor, os splitters analógicos deveriam ser feitos por meio de transformadores para isolar eletricamente o sinal de cada um dos seus destinos. Porém, devido ao custo elevado de um sistema com múltiplos transformadores por canal, muitos sistemas funcionaram e funcionam até hoje sem esse cuidado, com as possíveis desvantagens de se sobrecarregar uma fonte de sinal como microfones a condensador ou ter variações do nível de sinal quando uma das consoles interligadas altera muito o ganho. As enormes mesas analógicas do passado também podiam trazer um patchbay no seu case para facilitar as conexões e preservar os seus conectores.

 

Com o advento da tecnologia digital e dos protocolos que permitem trafegar com o áudio em rede, hoje todos os sinais podem trafegar por um único cabo de rede, e determinamos digitalmente os caminhos que desejamos que esses sinais trafeguem entre os conectores físicos ou digitais das entradas e destinos. Então, ao invés de ficarmos conectando metros e mais metros de cabos analógicos, sujeitos a serem contaminados por interferências, programamos os patches numa tela da console, tablet ou computador, e os sinais trafegam no domínio digital.

 

Vale abrir um parêntese para considerar o seguinte: muitos sistemas de PA ainda não estão totalmente livres das conexões analógicas. Tipicamente veremos conexões analógicas entre os instrumentos e as entradas dos sistemas. Também, mesmo em grandes sistemas de PA usados em turnês, ainda vamos encontrar periféricos analógicos vintage de primeira linha, venerados pelo seu desempenho e o timbre que conferem aos sinais, e estes ainda são conectados por cabos analógicos.

 

Dentro de um equipamento digital, podemos fazer o chamado “soft patch” conectando, por exemplo, uma entrada física a um determinado canal. Enquanto, por padrão, imaginaríamos usar o sinal que chega na entrada física 1 no canal 1, podemos, por meio de um soft patch, enviar esse sinal para qualquer outro canal. Com esse recurso, as consoles passam a oferecer flexibilidade total nos conectores de entrada e saída, e podemos determinar o caminho interno do sinal recebido ou enviado por eles.

 

Imagine que você já esteja com toda a banda conectada, e lhe informam em cima da hora que será preciso acrescentar mais um elemento de percussão, ou um backing vocal. Se você não deixou canais vagos entre os grupos, como costumo recomendar (ou não teve como deixá-los por falta de canais suficientes na mesa), esse soft patch vem auxiliá-lo. Você pode conectar esse novo elemento no conector físico que tiver vago lá no final dos canais da mesa. E então, por meio de um soft patch, você liga esse conector de entrada no canal seguinte aos dos outros backing vocais, mantendo a sequência dos seus canais logicamente organizada por deixar a entrada desse acréscimo de última hora ao lado dos outros canais congêneres. É claro que precisaria ainda promover os conectores restantes (subindo 1 canal no patch de cada entrada física subsequente para não “atropelar” nenhum elemento da sua mix). Mas assim você não fica com 3 backing vocais em canais seguidos e o que foi acrescido por último perdido lá longe.

 

Como exercício de raciocínio, vamos pensar neste cenário no contexto dos Bus que vimos na nossa última oportunidade. Ao acrescentar esse backing vocal de última hora na sua mix, digamos no canal 36, você certamente o endereçaria para o mesmo bus do subgrupo de vocais que os outros backings. Assim, se essa voz não requeresse ajustes, individualmente, durante a apresentação, esse endereçamento ao bus já ajudaria bastante por trazê-lo junto num mesmo master de subgrupo que os outros 3 backings. Mas se for preciso ajustar o nível apenas desse canal para a voz não se sobressair ou ficar muito baixa na mix, é aí que essa possibilidade de ter o seu fader ao lado dos outros backings facilita muito, em contraste com precisar procurá-lo isolado lá no canal 36, que provavelmente estaria até em outra página da console.

 

Se ao ler isso você está sonhando com esse recurso que a sua console digital mais simples não lhe oferece, uma solução parcial pode ser essa: até mesmo algumas das consoles modelo stage box oferecem uma solução chamada “View Groups”. Nessa solução, por estar operando em tablet ou computador, você cria grupos de visualização, em que escolhe as entradas e saídas que quer reunir numa única tela, independentemente de onde elas estejam na console. Isso não permite inverter a sequência dos canais ou reconfigurar o patch de entrada, mas no nosso exemplo você poderia montar um View Group com os 3 backs originais, digamos dos canais 16, 17 e 18, seguidos imediatamente pelo 36, que chegou de última hora, deixando-os lado a lado. E é claro que, como não custa nada, eu já acrescentaria mais o fader master do subgrupo dos vocais nessa mesma tela.

 

Outro exemplo prático dos soft patches pode ser para manter uma sequência lógica, deixando os canais alinhados entre consoles de PA e transmissão/gravação e/ou as pistas numa DAW (Digital Audio Workstation, aplicativo que permite gravar e reproduzir simultaneamente múltiplos canais ou tracks em pistas independentes), simplificando, assim, encontrar o sinal de um instrumento ou voz. Supondo que surja um problema em que o sinal não chega numa das consoles, fica muito mais fácil rastrear o sinal e diagnosticar o problema se ele estiver no mesmo canal das 2 ou 3 consoles. Pois, se ele chega em uma e não na outra, já identificamos que o problema não está no microfone, mas no split ou roteamento para a console que não recebe o sinal. Também, especialmente se a sua aplicação envolver gravação em multipistas, é importante criar uma planilha que relacione as entradas físicas da console com os canais e os tracks na sua DAW. Caso contrário, o potencial para se perder canais e acabar com uma coisa no lugar de outra é bastante real.

 

Abrindo agora o zoom, para sair da console, no universo atual do áudio digital já tem mais de uma década que os fabricantes de processadores, módulos de efeitos, plugins, gravadores (etc.) profissionais lançam produtos com o recurso de trabalhar em redes de áudio sobre IP. Existem diversos protocolos digitais como Dante, MADI, Q-LAN e AVB. Algumas dessas redes até se intercomunicam pelo padrão de interoperabilidade AES67. E algumas delas admitem o uso de equipamentos comuns usados em redes de informática, como os switches, para o envio de sinais entre os equipamentos. Com isso, agora um operador competente de áudio precisa assimilar, além dos fundamentos essenciais do som, conhecimentos sobre o funcionamento das redes de transporte de sinais por IP, se for lidar com áudio no contexto de equipamentos digitais.

 

Daremos sequência em nossa próxima oportunidade, até lá.

 

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