Ao longo do último ano e pouco, consideramos o processo de mixar, focando nos diferentes tratamentos a que sujeitamos os sinais que recebemos para chegar numa mix de qualidade. Mas saber conseguir a máxima qualidade de uma mix envolve mais do que apenas ajustar níveis, equalização e processamento. Para alcançarmos uma qualidade superior, é preciso ter uma boa compreensão do sistema que operamos, entendendo como trafegam os sinais sob nosso controle, para determinarmos as melhores formas de processá-los.
Quando conectamos um microfone na entrada de um sistema de som, ele atua como um transdutor, convertendo a energia acústica que o seu diafragma recebe a um sinal elétrico de poucos milivolts. Esse sinal, inicialmente frágil, que ele fornece iniciará, então, uma viagem através de conectores, cabos e equipamentos até chegar ao equipamento de destino, onde passará por outro transdutor e pelo ar para ser, finalmente, recebido pelo sistema auditivo do seu ouvinte remoto ou congregantes presenciais.
Com a pluralidade das formas de se ouvir um som atualmente, os equipamentos envolvidos acabam variando em complexidade e qualidade. Eles podem ter início em um megafone extremamente simples, por ter ambos os transdutores de captação e projeção incorporados no mesmo aparelho. Eles passam pelos celulares em que ouvimos conteúdo por streaming com fones de ouvido, caixinhas Bluetooth ou no sistema de som do carro. Existem sistemas de PA simples, sistemas que oferecem mais recursos e, por fim, os caríssimos sistemas profissionais capazes de processar centenas de canais para a sonorização de estádios em turnês de nível internacional.
Na Igreja corpo de Cristo que se estende ao redor desse nosso planeta, as possibilidades de escala ou complexidade dos sistemas técnicos também são imensas. No caso teórico em que se tivesse verba ilimitada, dá praticamente para se dizer que é sempre possível se gastar mais em equipamentos. Mas, como no contexto da igreja, lidamos com recursos ofertados e, possivelmente, ofertados com sacrifício, cabe aos que estão envolvidos na aquisição de equipamentos ser coerentes em encontrar a melhor relação custo-benefício dos equipamentos a serem adquiridos. Esta expressão não significa insistir no equipamento mais barato, que frequentemente acabará saindo caro, ok? Mas, sim, se refere a investir em equipamento que atenderá com qualidade, durabilidade e complexidade condizente com a capacidade de operação pela equipe de voluntários, além de uma previsão para flexibilidade para poder atender bem à igreja que o adquiriu por 10 a 20 anos ou até que a demanda dela sofra uma mudança radical.
Uma das razões que tenho me proposto a cooperar com a Revista Backstage nesses anos é para justamente aumentar o nível de conhecimento dos que servem nessa área. Pois quanto mais se conhece, quanto maior for a percepção do que existe à disposição e como pode ser bem utilizado, mais bem preparado se estará para tomar decisões assertivas de aquisição. E para, quando envolver uma situação de aquisições maiores, haver um embasamento que permita conversar inteligentemente com o profissional projetista ou revendedor para que os recursos da sua igreja não sejam desperdiçados como tristemente acontece em muitos, senão a maioria dos casos.
Então, vamos pensar em diversas situações práticas, progressivamente mais complexas ou sofisticadas, vendo o que acontece com o sinal a partir do momento que se pluga um mic na entrada destes sistemas de som. O sinal recebido na entrada do sistema irá trafegar por um número maior ou menor de equipamentos, conforme a dimensão do sistema necessário para atender a cada necessidade.
Caixas com Amplificação e Mixer Integrados
Atualmente, os fabricantes têm produzido estas caixas de som ativas com circuitos de maior ou menor simplicidade que permitem conectar e mixar poucos canais de entrada, sem precisar depender de uma mesinha de som. Isto pode ser bastante prático para situações de ensaios, grupos pequenos e cultos infantis, por exemplo em que se juntam dois ou três canais como voz e instrumento. Alguns também oferecem o recurso de reprodutor de arquivos musicais digitais como MP3 que podem ser usados como playback na ausência de instrumentos ou para tocar uma música referência que se deseja aprender num ensaio. O tempo de montagem é mínimo bastando conectar na energia e, somente após conectar os microfones e instrumentos, ligar a caixa.
Um dos elementos que pode dificultar ou até inviabilizar o uso deste sistema é um ambiente tão pequeno e/ou necessidade de um som tão alto que fica difícil trabalhar com o microfone aberto sem dar início à microfonia, e não haver como tentar aplicar um paliativo por, tipicamente, não haver equalização por canal. Nesse caso, para evitar a microfonia é preciso adotar técnicas mais básicas e fundamentais como conhecer os ângulos de captação do microfone e o de projeção do/s driver/s da caixa, evitando que o microfone capte o som direto ou refletido dos agudos e médios. Já no caso de uma microfonia nos graves, que não são direcionais, é preciso respeitar a regra mais fundamental da microfonia aumentando o nível acústico produzido pela voz da pessoa para que o microfone “ouça” mais forte o som de quem fala ou canta do que o som que vem da caixa. Algumas caixas possuem filtros passa-altas que podem ajudar nesse sentido, porém ao custo de cortar os graves de instrumentos ou dos arquivos reproduzidos em MP3.
Tecnicamente, a simplicidade oferecida por este tipo de equipamento é interessante desde que não seja necessário que a mix seja muito precisa ou dependa de ajustes como equalização etc. e não seja necessário que um operador fique continuamente mixando as entradas, pois os controles costumam ficar atrás dessas caixas e ficar muito tempo bem próximo a uma caixa que amplifica o som para um grupo pode facilmente expor a pessoa a níveis prejudiciais à sua audição.
Em relação ao fluxo de sinal, os sinais nas entradas passam diretamente da etapa de pré-amplificação que eleva o nível de poucos milivolts fornecidos pelo microfone a um nível line que é mixado e alimenta o amplificador conectado aos transdutores que converterão esse sinal elétrico em energia acústica. Enfim, é um sistema um pouco mais sofisticado que o megafone que mencionei inicialmente e que, com certeza, proporciona uma qualidade melhor por ter uma faixa de frequências mais ampla e permitir o ajuste de nível de várias entradas.
Sistemas com Mesas de Pequeno Porte
“Não desprezem os começos humildes (Zc 4.10)”!
Uma das grandes vantagens dos sistemas pequenos, bem dimensionados, é a economia de tempo de montagem que proporcionam. Recentemente montei um sistema com uma mesinha Mackie com seis canais com prés e quatro canais estéreo ligada diretamente em duas caixas amplificadas da Fostex (essas com uns 30 anos de estrada). A banda composta por um vocal, dois violões (um com pedal estéreo) um teclado e cajon, proporcionou um som “cheio” com detalhes agradáveis. O sistema atendeu com qualidade muito boa aos cento-e-poucos membros da minha igreja presentes na reunião de confraternização de final de ano, que foi realizada em um salão sem tratamento acústico de uma chácara. O retorno foi feito por uma mesinha de fones alimentada pelos Inserts dos canais da Mackie. Estas saídas foram convertidas em direct-outs com o auxílio de uma abraçadeira “enforca gato” nos plugues TS, para evitar que fossem inseridos até o final na mesa, mutando o sinal, e pegassem apenas a cópia do sinal de entrada para enviá-lo para a matriz de fones. A ausência de caixas de retorno projetando som na parede lisa de fundo na área que estavam os músicos ajudou bastante a não “embolar” o som.
Já devo ter disso isto antes, mas quando os músicos e todos os elementos num sistema são de qualidade, o resultado dificilmente não será bom. E o trabalho do operador é mínimo, bastando levantar o som com uma estrutura de ganho correta e ficar atento a alguma variação ou outra de nível. Aliás, os recursos nos canais da mesa que usei são limitados a um filtro passa altas fico em 75 Hz, e três faixas de equalização fixa: Agudos em 12 kHz, Médios em 2,5 kHz e Graves em 80 Hz.
Em relação ao fluxo de sinal, em comparação com apenas a caixa amplificada, nesta confraternização agregamos uma segunda caixa amplificada, a mesinha Mackie e a matriz de retorno por fones. Os sinais dos músicos vinham diretamente até as entradas da mesa por cabos de 10 m onde, após serem pré-amplificados, a cópia do seu sinal era derivada para retornar individualmente para a mesinha de fones. O Auxiliar 1 da mesa Mackie foi comutado para pré-fader e usado para somar o violão do líder de louvor com a voz dele antes de enviar para a matriz de fones. Os outros sinais de retorno seguiam diretamente para as entradas da matriz.
O que é essa matriz? É um equipamento que recebe até oito entradas e permite que seis músicos as mixem para ser amplificadas e enviadas aos seus fones. Além das quatro entradas mono, ela tem uma entrada estéreo com controle por canal de saída e mais uma estéreo que cai direto na master de cada canal. Originalmente fabricada por volta dos anos 2000, pela empresa OZ Audio, fornecedora de componentes OEM da Mackie, a Mackie acabou comprando esse projeto dela, mas infelizmente a retirou do mercado pouco tempo depois. A sua aplicação principal era atender a estúdios e salas de ensaio, mas atende muito bem a pequenas bandas em que ela fica centralizada entre os músicos. Em nossa próxima oportunidade, voltaremos com as consoles digitais compactas. Até lá!