Anuncio topo
REPORTAGENS / Colunas

Restauração e conservação de microfones clássicos

08/03/2024 - 18:18h
Atualizado em 08/03/2024 - 18:18h

 


 

 

Caro leitor.

Hoje vamos falar sobre alguns mitos e verdades que permeiam o mundo dos microfones clássicos. A intenção do artigo não é apenas trazer os mais frequentes erros cometidos pelos proprietários de estudios. E sim, também, compartilhar valiosas dicas para quem quer manter o valor histórico e financeiro dos microfones.

Nos últimos anos venho observando o aparecimento de vários “especialistas” no campo da restauração e conservação. A grande maioria formados na YTU (YouTube University). Todos esses são meros repetidores. Escutam mitos, inventam mais bobagens, e rapidamente compartilham suas “descobertas” com um ar de grande conhecedor. Alguns até são GURUS para um pessoal que prefere o tal conhecimento instantâneo.

 

 

Verdades:

Existem dois tipos básicos de restauração quando se refere a microfones e equipamentos: o museológico, que é para peças que compõem um acervo e ficarão em exposição no museu, e o que chamo de “Restauração para uso prático”.

 

No primeiro é mandatório a total preservação de todos os materiais e componentes originais daquela peça. Principalmente o acabamento, sendo pintura / verniz ou cromo / níquel, mas em qualquer dos dois casos, a alteração no acabamento arruinará o valor histórico financeiro do microfone.

 

O segundo tipo é a  Restauração para uso prático, sendo que acontece uma combinação entre os dois tipos. Nesse caso também se observa a preservação do acabamento mantendo a estética original de um microfone com décadas de fabricação. É essencial ainda a preservação dos componentes principais como capsula, transformador e FET ou Válvula (se estiver boa), porém é fundamental a reposição de componentes auxiliares, como resistores e capacitores. Isso tem que ser feito com critério, respeitando as especificações originais do projeto e características dos componentes que serão substituídos.

 

É importante dizer que há parâmetros fundamentais para se considerar numa troca de componentes no circuito de um microfone. Explico melhor: Por exemplo um resistor de 100k x 1/8w não é igual a outro com mesmo valor ôhmico e potência. Não estou falando apenas da tolerância, e sim de uma lista de parâmetros e características de fabricação. Isso também se aplica a capacitores! Não considerar isso provocaria uma mudança no timbre original. Em resumo, não é tão simples como pensam...

 

 


 

Primeiro Mito:

Um dos maiores mitos é que deve se conservar resistores e capacitores que ainda não estão totalmente danificados. No pensamento de alguns “especialistas”, o que não está danificado está bom. Mesmo com uma variação de valor absurda! Por volta dos 20% ou até mais. Na prática o som do microfone vai variar de um dia para outro.

 

 Então imagine o seguinte cenário: aquela produção com um bom orçamento para gravar um artista nacional, que vai lhe trazer um bom retorno profissional. No dia da gravação você quer usar a sua joia rara, seu Neumann U47 Tube (por exemplo) que certamente vai agregar valor ao seu trabalho. Mas, de repente, no meio da gravação, você escuta algo de errado: é o seu querido microfone com defeito. Você custa a acreditar. Troca cabo, pre-amp, dá uma desculpa para o cliente e coloca outro microfone no lugar. O mais interessante é que isso se repete pelos estudios dentro e fora do Brasil.


 

 

 

 

Outro Mito

Comprar capacitores e resistores NOS (New Old Stock). Esse talvez seja o mito mais furado de todos. Não vou me aprofundar nos detalhes. Começando pelos capacitores, vamos ao básico: os capacitores eletrolíticos são componentes compostos por duas placas metálicas separadas por um isolante, enrolado num tubo e embebida numa solução eletrolítica. Vamos pensar um pouco... Um capacitor feito há, ao menos, 40 anos, seguramente já está com as características elétricas alteradas. Mesmo aquele que nunca foi usado. Dentre os problemas temos a oxidação e a reação química interna sofrida durante décadas de armazenamento, por muitas vezes inadequado. Lembrando que capacitores vão além de capacitância e tensão de isolação.

 

 

Para os resistores o problema é semelhante, mas com o agravante da qualidade do verniz de proteção usado por alguns fabricantes. A baixa qualidade do verniz deixa entrar umidade no corpo do resistor. A umidade oxida os clips dos terminais, e altera a estabilidade ôhmica  do resistor. Em resistores acima de 50M ohms isso é muito mais crítico. Basta um dia chuvoso para ter uma mudança significativa.

 

 

Conservação:

Primeiro vou dizer o que você nunca deve fazer. NUNCA tente você mesmo limpar a capsula do microfone. Por mais que você acredite que vai funcionar. Na minha experiencia de mais de 30 anos de trabalho, NUNCA vi alguém fazer e funcionar. O que acontece frequentemente é o dano total da capsula (Detalhe na foto). Ou seja, gera aquela situação de “se você não tivesse mexido, eu conseguiria deixar a capsula 100%. Mas agora só uma nova...”. Às vezes o cliente nem consegue pagar o valor da capsula- principalmente se for Neumann - e o microfone fica inutilizado. Limpar capsula é um processo complicado. E quem realmente sabe não vai fazer vídeo para internet, ok?

 

 

 

Em segundo lugar, NUNCA use secador de cabelo para tirar a umidade da capsula. Provavelmente você vai danificar o diafragma da capsula. Daí só outra... Deixar o microfone à sombra na área externa para “pegar” um calor e tirar a umidade também não resolve. É apenas um paliativo. Mas seu  microfone ganhará uma porção extra de poeira no diafragma. Tudo na promoção!!  (atenção, contém ironia!).

 

 O uso de caixa com lâmpada também é outra medida paliativa. Vai funcionar enquanto a poeira e os fungos estiverem secos. O problema é que dependendo do histórico do microfone, o diafragma de pvc ou Mylar da capsula vai ressecar ainda mais, até o ponto de rachar e romper. Eu já vi isso acontecer mais de uma vez.

 

Na verdade, a capsula só retem a umidade porque tem acúmulo de poeira na superfície do diafragma. Dependendo do clima da região, é comum formar colônias de fungos na parte interna da capsula. Em todos os casos, mesmo depois de limpa a capsula precisa ser tratada com cuidados espaciais. O processo químico de limpeza retira em torno de 99% dos fungos da capsula. Se não forem tomado os cuidados,  a colônia de fungos  crescerá  novamente.

 

 

 

 

Cuidados Básicos:

 

É muito importante que o microfone seja guardado numa caixa plástica do tipo para conservação de alimentos com sílica gel.

O estojo original só deverá ser usado para um rápido transporte.

Não se deve deixar o microfone montado por tempo indeterminado no pedestal porque assim ele ficará exposto a poeira e umidade do ar.

Não submeta o microfone condenser de ou fita a uma fonte sonora com alta pressão de ar. Isso pode causar rachaduras ou rupturas na cápsula.

Nunca use o microfone sem Pop Filter.

 

 

 

  • COMPARTILHE
voltar

COMENTÁRIOS

Nenhum cadastrado no momento

DEIXE SEU COMENTÁRIO

Escreva sua opinião abaixo*