Em nossas últimas oportunidades, vimos os detalhes sobre a equalização numa mixagem. Ela é essencial para se conseguir um som limpo em que os instrumentos e vozes sejam nitidamente audíveis, como é o nosso alvo ao mixar. Porém, indo além das frequências, quando mixamos, também temos a preocupação com o nível dos instrumentos, deixando cada um audível e em um nível coerente com o gênero musical. Novamente, podemos ter maior ou menor facilidade em nossa tarefa, dependendo da habilidade e técnica dos músicos e da qualidade dos seus instrumentos. Mas, pelo menos na minha experiência, foram raras as vezes que a mix veio “pronta” do palco.
O básico para controlar o nível de um componente na mix é o uso dos faders de cada canal. E para simplificar o nosso trabalho, é recomendável agrupar os elementos da mix em subgrupos e por meio dos VCAs ou DCAs que nos permitem controlar grupos de diversos canais (com conteúdo semelhante) por meio de um único fader.
Mas, por mais que a nossa distribuição e organização dos canais em grupos nos ajude a manter os elementos da mix dentro dos níveis desejados, ainda estamos sujeitos a uma voz ou instrumento subir demais encobrindo outros elementos e desequilibrando a mix. A solução da tecnologia que vem ao nosso auxílio é a compressão. Há não muito tempo atrás, era feliz quem possuía uns três ou quatro compressores para controlar a dinâmica dos sons nas suas mix. Atualmente podemos agradecer aos avanços da tecnologia de áudio digital, pois até mesas pequenas de 8 canais oferecem compressão por canal e nas saídas.
Mas como se usa a compressão? Como toda ferramenta, o seu mau uso pode comprometer a qualidade. Então, vamos considerar a sua funcionalidade. Uma das vantagens que a compressão oferece ao operador é o controle quase instantâneo da amplitude, de quanto sobem os picos do sinal de áudio ou, até mesmo, o controle do sinal todo, se a compressão for pesada. Assim, um dos seus usos principais é ajudar a domar os níveis produzidos por uma voz, instrumento ou até de uma mix inteira.
Mesmo que um operador experiente estivesse com a mão no fader de um canal em que o nível de sinal aumentasse rapidamente, seria impossível ele o controlar com a velocidade e precisão oferecidas pela compressão, porque ela monitora o sinal e atua eletronicamente. E podemos ajustar a compressão para atuar apenas nas partes do sinal que desejamos (os picos ou com compressores multibanda apenas determinadas frequências). Assim, em contraste com apenas recuar o fader, baixando todo o sinal do canal, o compressor pode atuar apenas nas partes mais fortes do sinal, evitando que se sobressaiam aos demais instrumentos, enquanto permite que os componentes mais suaves do sinal permaneçam inalterados.
Antes de entrar nos ajustes da compressão, cabe deixar este alerta essencial: como a compressão trabalha com níveis de sinal, é extremamente importante que o compressor seja ajustado depois de feito o ajuste de ganho (o primeiro passo em qualquer trabalho com mixagem) e, na prática, depois que a banda tiver tocado uma ou duas músicas na passagem de som, para já estarem tocando com se estivessem na apresentação. Caso contrário, os ajustes do compressor não produzirão o efeito desejado. E, mais uma vez, é preciso ressaltar com os músicos a importância de manter os seus níveis uniformes para serem mixados.
A inteligência artificial avança rapidamente, mas enquanto ela não estiver incorporada em nossas consoles, será preciso que nós determinemos os parâmetros da compressão. O primeiro passo para determinar o funcionamento de um compressor é informar a partir de que ponto nós queremos que ele atue. Fazemos isto no ajuste do limiar ou Threshold. Deixando o limiar no mínimo, o compressor atuará sobre praticamente qualquer sinal que passar por ele. Subindo o limiar, estaremos informando ao compressor que ele só deve começar a atuar após o sinal passar deste nível de limiar que estabelecemos.
O próximo ajuste é o do ataque ou Attack. Neste controle, determinamos o tempo que o compressor esperará para atuar, após o sinal cruzar o limiar. Com o controle de ataque no tempo mínimo, o compressor atua quase que imediatamente. Isto talvez não seja desejável, pois, dependendo dos demais parâmetros, atuar imediatamente, alterando o início do envelope do sinal, pode descaracterizar o som do instrumento.
Entender o que é esse “envelope” de um sinal nos ajuda a compreender a funcionalidade de um compressor. Podemos definir o envelope como sendo o resumo da energia de um sinal ao longo do tempo. A pegada inicial numa corda, pele ou tecla do instrumento gera um pico, também chamado de Attack, em que a energia parte do zero até a sua intensidade máxima. Cuidado para não confundir esse pico chamado Attack com o tempo que o compressor leva para iniciar a sua atuação. Após uns instantes, perde se um pouco dessa energia inicial e o sinal decai na fase de Decay. A seguir, a corda, pele ou som eletrônico do instrumento pode ressonar, sustentando-se por um tempo na fase de Sustain. E por fim, a sua energia começa a se esgotar na fase de Release.
Voltando ao ajuste do compressor, se quisermos preservar o impacto inicial de uma baqueta na pele de um tambor ou a característica sonora da pegada do dedo numa corda do baixo, deveremos aumentar o tempo de ataque, para que o compressor só inicie a sua atuação depois de deixar passar este componente inicial do som. Passado este tempo do Attack, o compressor atuará.
Com o limiar devidamente ajustado, quando o sinal é gerado pelo músico, o pico sonoro do ataque começa a se elevar. Em algum momento, ele cruza o limiar e isto autoriza o compressor a atuar sobre ele logo que acabar o tempo de espera que determinamos no ajuste do Attack. O compressor atuará reduzindo o sinal na proporção que determinarmos no Ratio. Veja a ilustração abaixo.
Na ilustração acima o envelope do som original, o que chegou na entrada do nosso canal ou compressor, está escurecido e o novo envelope produzido pelo compressor aparece em primeiro plano. Logo após a curva começar a mudar de amarelo para laranja o sinal cruza a linha pontilhada em que ajustamos o Threshold. A partir dali, temos alguns milissegundos determinados no Attack e então o compressor está liberado para reduzir o pico do envelope produzido pelo músico, na taxa de compressão que determinamos no Ratio. Isto ilustra como o compressor atua apenas contendo a energia do pico no ataque.
O último controle para ajustar o compressor é o Release, ou seja o tempo para ele deixar de atuar sobre o sinal depois que este cruzou o limiar. Aqui deve se tomar o cuidado para não deixar um tempo muito curto pois se o tempo do Release se acabar enquanto o nível de sinal ainda estiver forte, ele subirá de repente, causando um efeito muito esquisito no som.
A taxa de compressão é sempre expressa numa relação entre dois números em que o segundo número, referente ao sinal de saída do compressor, é sempre 1. Então, o que nós ajustamos no Ratio é o primeiro valor na proporção, informando ao compressor em que taxa ele deverá reduzir o sinal de entrada mantendo a saída sempre em 1. Nas mesas digitais, as telas de ajuste de compressão costumam exibir um gráfico em que vemos a proporção em que o sinal é comprimido a partir do limiar. Observe a ilustração abaixo.
Neste exemplo, o Threshold está ajustado em -40dB. No primeiro gráfico, temos o Ratio ajustado na taxa de 1.5:1. Isto significa que após o sinal de entrada ultrapassar o limiar, ele terá que subir 1,5dB para produzir um aumento de 1dB na saída do compressor. Supondo que o sinal de entrada alcançasse 0dB subindo 40dB acima do limiar, o compressor atuaria e o sinal na sua saída chegaria a uns 27 dB que são os 40 da entrada divididos pela taxa de compressão de 1,5 (26,67).
O segundo gráfico é mais intuitivo. Com a taxa de compressão em 2:1, após o sinal cruzar o limiar, o sinal de entrada precisa subir 2 dB para produzir um aumento de 1dB na saída do compressor. Quando o sinal subir 40dB além do limiar, alcançando o 0dB, o sinal da saída terá subido apenas 20 dB porque a relação de 2:1 equivale à metade.
Pulando para o Ratio de 4:1, quando o sinal de entrada bater em 0dB, o sinal de saída terá subido um quarto dos 40dB, ou seja apenas 10 dB acima do limiar.
E para um Ratio de 6:1, o sinal na saída subirá apenas uns 7dB acima do Threshold (40/6=6,67).
O último gráfico nos mostra a função do Limiter no Ratio de ∞:1. E aí, por mais que o sinal de entrada suba, o sinal de saída não passará um dB do nível de -40dB determinado no Threshold.
Compreender esta mecânica das taxas de compressão é importante para o nosso embasamento técnico, mas vale o conceito que já foi colocado quando vimos a equalização: o som que nós mixamos será apreciado pelos ouvidos, portanto, não devemos ficar fazendo contas e sim deixar este conhecimento em segundo plano apenas usando-o para confirmar aquilo que ouvimos caso surgir dúvida. Então, enquanto este lado mais matemático tem a sua utilidade, ao escolhermos as taxas de compressão precisamos adotar outro raciocínio.
Como estes números da ilustração ilustram, os compressores são ferramentas que nos permitem influenciar profundamente um sinal. Quando os usamos estamos alterando a dinâmica dos sons que recebemos na console. Esta dinâmica é a variação da intensidade sonora que caracteriza uma voz ou instrumento e ela pode variar com a técnica adotada pelo músico. Daí, vemos que quando aplicamos a compressão, precisamos estar conscientes de o que queremos fazer. Pois como engenheiros de som, devemos transmitir a linguagem e sentimento produzido pelos músicos aos ouvintes, sem os alterar drasticamente, pois isto acaba sendo uma forma de distorção, ao não permitir que o som que passa pelas nossas mãos chegue com fidelidade a quem o ouve.
Voltaremos com mais sobre compressão em nossa próxima oportunidade. Até lá, se tiver a possibilidade, vá se familiarizando com os controles comentados e principalmente os seus efeitos sobre o sinal. Até lá!